é com esta estupenda música que termino, pela 3ª ou 4ª vez o meu trabalho neste blog. depois de vários meses sem publicar nada, era inevitável fechar este espaço. desta vez será mesmo definitivo. a continuar com a publicação será noutro espaço, provavelmente no tumblr. em cerca de 2 anos consegui acumular textos de naturezas muito diferentes, frutos de uma evolução que já há muito pedia um espaço diferente.
entretanto deixarei aí o link do novo espaço, caso ele nasça.
é um erro pensar que é preciso inundar um filme de música para que ele seja um canto. com apenas uma composição (com várias variantes) este filme fica perfeitamente servido, tendo uma das melhores bandas sonoras que já ouvi. pactua com a premissa da narrativa, sente-se esse não pertencer que mata a dignidade, sente-se um sonho, uma obsessão, previsivelmente fatal. mas mais que um retrato social, é um retrato emocional de uma espécie condenada a ter menos do que a alma precisa.
os londrinos The Oscillation têm neste Veils um som único, misterioso, psicadélico, progressivo. é um véu que se levanta, permitindo ver um pouco do funcionamento da mente. é música conceptual da boa. ouvir este álbum é um interessante exercício de psicanálise. um álbum mágico de teclados dançantes, de guitarras simpáticas, de percussões esquizofrénicas e vozes desfocadas. começa bem e acaba ainda melhor, tendo na faixa título o seu mais alto ponto. provavelmente um dos álbuns do ano. pelo menos para mim vá...
e aquela que é a mais harmoniosa banda do momento apresentou assim mais um tema do novo álbum com este excelente vídeo. não há muito a dizer. estarão em portugal no Optimus Alive no dia 8 de Julho.
banda de diversas facetas diferentes. desde a música tipicamente 80's, à fase desintegration, provavelmente passando por outras que desconheço, os The Cure foram-se tornado numa das bandas mais populares do momento e com grupos de admiradores das suas diversas faces. a minha preferida é a mais caótica, no entanto, não posso deixar de me apaixonar por esta versão, tal como está feita.
a partir de um conjunto de cassetes apagadas num videoclube, surgiu a necessidade de regravar todos os seus filmes. isto para as personagens de Jack Black e de Mos Def (rapper habituado a papéis caricatos no cinema mais non-sense), no videoclube de Danny Glover, vizinho de Mia Farrow. é assim que Michel Gondry constrói o argumento e a filmagem de um filme sobre a criatividade, a capacidade de improvisar e o direito que temos de controlar a nossa história. o filme torna-se em certos pontos muito (...), mas no final, acaba por valer a pena por um par de piadas, um par de morais e um par de momentos de verdadeira arte cinematográfica.
Miss Falewicz: The past belongs to us, and we can change it.
Jerry: How come you never got married Mr. Fletcher? Elroy Fletcher: Well, the common story is, the girl that you's gon' ask you waited too long to ask. She went on to marry somebody else and then you can't find anybody to compare to her, so what happens?... You get old.
existem vários exemplos de como o título traduzido perde alguma força. este é um deles, pois desaparece o trocadilho presente na palavra single. se por um lado o homem é singular, também está só e é a conjunção destas duas realidades que desencadeiam a história.
já em relação ao filme, é impossível falar dele sem falar em poesia. a câmara capta com uma beleza tocante cada imagem, fazendo jogos de cor que cantam a música magistralmente composta para o efeito. um poema sobre solidão, sobre o presente, o futuro, o passado, o medo, o ver as coisas de uma forma singular, notavelmente construído de uma ponta à outra. a realização é perfeita, o argumento poético, as interpretações soberbas, a música transcendente.
George: I always used to tell him that only fools could possibly escape the simple truth that now isn't simply now: it's a cold reminder. One day later than yesterday, one year later than last year, and that sooner or later it will come.
até 1968 esta foi a banda de Janis Joplin e, diga-se de passagem, foi por aqui que surgiram os maiores êxitos daquela que é considerada uma das maiores vozes de sempre. estes dois temas são do último álbum da banda com a Janis, Cheap Thrills. e quão poderosos é o álbum!!!
os Smith Westerns trouxeram-nos neste início de 2011, os sons que John Lennon tanto explorou no final da sua carreira. falo de mind games e de 9# dream. e que bem que sabe relembrar estes sons. e se este álbum não passa muito daí, não faz mal: é música que sabe bem ouvir.
o que mais fazem os maus amigos é prometer coisas que não virão a cumprir. espero que não seja o caso dos mau amigo, que prometem com esta demo ser uma das bandas portuguesas mais relevantes da década que por agora se começa a montar. já está lá muita coisa, falta aquilo que só o tempo traz. por agora vou esperando pelo álbum de estreia desta banda que nasceu num concelho vizinho, onde nunca esperaria que aparecesse algo desta dimensão e estilo: monção.
a obra-prima de 1984 de Roger Waters, The Pros and Cons of Hitch Hiking está quase ao nível do nome Pink Floyd. reflectindo sobre uma viagem numa crise de meia-idade, foi apresentado aos restantes Pink como sugestão para sucessor do Animals, juntamente com o The Wall. este último foi o escolhido. destacando a guitarra de Eric Clapton, este álbum mantém as letras incríveis, o baixo mágico e a voz dolorosa (no bom sentido) do Roger. um álbum a ouvir, cuja sonoridade ronda a dos dois últimos da era Waters nos PF.
esta música do álbum de estreia dos Mogwai transmite-me isso mesmo: fragilidade. é provavelmente a música mais frágil desse álbum, uma das poucas que inclui letras extensas. é uma depressão no meio de um mar de força e poder. é a beleza que extravasa do excelente Mogwai Young Team.
várias pessoas reagiram de várias formas diferentes à demissão do governo. há quem tenha festejado, há quem tenha ficado assustado, eu fiquei na mesma, mas com uma ligeira satisfação. se por um lado esta mudança não serve de grande coisa a nível político, a nível psicológico foi a notícia do ano, porque muita boa gente não suporta o senhor engenheiro. confesso que vou ter saudades da lábia dele e da sua incompetência, consciente ou não, para governar o país de forma justa e equitativa. de qualquer das formas o pior que acontece ao país é ficar na mesma, continuar neste limbo para sempre. sim, porque existem duas hipóteses bastante simples para a crise: a reascensão ou a queda. à parte isso o PS faz uma oposição muito mais eficaz que a do PSD e tem mais boys também. bem que vão disfarçando a coisa com solidariedade do estado mas enfim... podia dizer mais alguma coisa, mas estou farto de política. saturado vá...
antes de comentar a paisagem política actual, que pouco tem de surpreendente, deixo aqui uma sugestão de audição que aborda a mudança da personalidade dos homens, a forma natural como eles se libertam de ideais, de sonhos, à medida que se vão apercebendo de que estão sós no mundo, por mais amigos que tenham. do magistral Bom Dia de 2004.
o que é a alma? a alma é um peixe com asas, uma epidemia, um poste nº13, um extintor nº13, uma bicicleta, uma passadeira, uma descida, uma rua, uma padaria, um restaurante italiano, uma palavra, uma música, uma decisão, um erro, um desastre, um furo na alma e tudo igual, tudo resto de um passado que nunca chegou a ser.
a alma não é mais que uma construção do intelecto, para disfarçar a enorme inutilidade e falta de valor do ser humano. a alma é uma manifestação do seu ego. porque nós somos importantes. chamamos alma ao sistema central que nos tenta manter vivos. é uma maldição. uma prodigiosa maldição.
um dos mais interessantes álbuns do final de 2010 é o homónimo destes evols (site). banda que estimula com música as dimensões visuais do cérebro. que se veja o poder das imagens do vídeo e das fotos do site deles (todas de um dos membros da banda). que se veja ainda a forma como a música deles sugere paisagens, personagens, acções. veja-se ainda algumas actuações ao vivo. eles são uma sequência de imagens, um filme, uma banda sonora. são uma das grandes revelações da música portuguesa.
creio que já vi um vídeo deste senhor no Bicho-Carpinteiro. o discurso apresenta uma perspectiva notavelmente interessante sobre a educação. aqui com um brilhante acompanhamento visual.
por outro lado não há nada mais gratificante que ultrapassá-los com pujança.
domingo, 13 de março de 2011
não há nada pior que sentir as nossas limitações. sentir que não conseguimos chegar a lado nenhum. sentir que somos vegetais e que somos meros espectadores de nós próprios. sentir que nem mesmo a nossa vontade vale coisa alguma.
aproveito para elogiar a enorme qualidade deste desenho animado. desde a música inspiradora, passando pelo humor inocente, chegando às reflexões sobre a vida, que podem ser muito duras, até para adultos, mas que muitas vezes mostram porque é que a vida é tão imprevisível.
completamente diferente de tudo o que os the gift têm feito, surgem estas músicas, mais psicadélicas, mais experimentais, mais pop, menos rock fm. depois da imagem relativamente original que escolheram para capa, depois da distribuição "à la radiohead" dão mais um passo interessante ao atribuírem a música a dois actores, acontecimento que já deu notícia lá fora.
voltando à música, ainda não tenho uma opinião muito bem formada. gostei dos coros. gostei de alguns pormenores instrumentais. não sei porquê, mas a potente voz da ... (toda a gente sabe, a mim escapou-me) enerva-me um pouco. para já vale a pena ir ouvindo. esta merece nota positiva, as restantes logo verei.
o tempo passa sem dar contas a ninguém. as contas dão-se a ele mas perdem-se no irrelevante. não é nisto que penso enquanto escrevo. escrevo palavras, penso palavras, pouco interessa se são iguais ou reais. o importante é respeitar o ritmo, respeitar a melodia. o importante é escrever, não porque interesse para merda alguma o que escrevo, mas porque escrever é mais do que não escrever. assim como pensar é mais do que não pensar. nem só de mais se faz a vida. não digo isso. não digo nada que não sei no que raio penso.
uma pequena amostra do excelente álbum High Violet, que estou a descobrir já tardiamente. foi considerado um dos melhores álbuns de 2010. os National vêm a portugal, se não me engano, em maio.
o projecto está na mesma. músicas novas há, mas com uma estrutura igual. o vídeo que se segue demonstra isso mesmo. gravado em Lisboa, chama-se falhanço precisamente porque foi um grande falhanço: não consegui aproveitar o potencial que a música tinha. por isso, deixei-a assim mesmo, sem sequer ajustar o ritmo. ainda assim não é feia, só um pouco desajeitada...
nos próximos tempos, probabilidade de haver novidades é relativamente pequena. ainda estou a trabalhar a abordagem que um projecto desta natureza exige. com pouco sucesso diga-se de passagem...
fundindo todo um conjunto de diversas influências obtemos o magnífico som dos Dead Combo. do lote de influências destacam-se o fado e os blues. tó trips e pedro gonçalves, uma guitarra e um contrabaixo, são suficientes para nos inserir no ambiente sombriamente cinematográfico dos Dead Combo, onde se sentem as ruas de lisboa e de todo o mundo. aclamados internacionalmente, são a voz da meia-noite, da melancolia e da saudade. são o som do bairro alto e de todos os bairros lisboetas.
"Nós somos malucos a cantar e a gritar mas não aspiramos ao poder. É o que nos distingue de outros que possam aparecer a gritar. É com esses que as pessoas têm de ter cuidado e os Homens da Luta também servem para avisar sobre isso."
cru.brutal. duro. perturbante. belíssimo. Biutiful é um filme lindíssimo na mais miserável dimensão da palavra, uma negríssima visão da vida e da morte. a performance de Javier Bardem é avassaladora, merecedora de um óscar. e depois, depois há as imagens e a música, e os ruídos e os diálogos, e as traças e o anel, e a sujidade e a podridão, brilhantemente coordenados por Iñarritu e direccionados para salas de cinema à antiga: só aí a experiência pode ser vivida ao máximo.
Biutiful é cinema, é um exercício dos sentidos. mais do que uma história transmite-nos sentimentos. olhando para os candidatos a óscar de melhor filme, não lhes fica nada atrás, aliás...
domingo, 6 de março de 2011
uma rua. um banco de jardim que parece uma zebra. uma criança que brinca com um hipopótamo apetrechado com uma hélice. um candeeiro que ilumina pouco. uma mulher que brinca com uma roda. um homem que jaz num mar de sangue, submerso pela roda, pela mulher, pela criança, pela escuridão, pela zebra.
senhores de um rock psicadélico admirável, os jennifer gentle encontram nesta circles of sorrow uma sonoridade mágica, de uma outra dimensão. do notável álbum Valende (2004, SubPop), que viaja entre sonoridades ora mais coloridas, ora mais melancólicas. parafraseando a faixa final: "nada faz sentido" neste álbum. por isso é tão importante ouvi-lo, vivê-lo.
pertencer é uma das mais básicas condições humanas. uma daquelas necessidades que nos influenciam de tal forma que chegamos mesmo a abdicar das nossas mais profundas crenças. no filme Human Nature de Charlie Kaufman uma das protagonistas abandona a sua natureza selvagem, tornando-se mesmo ajudante de um laboratório, por amor. o amor é essa manifestação máxima da necessidade de determinada pessoa. mas nem sempre precisamos de uma só pessoa. às vezes é respeito, outras reconhecimento, outras carinho, outras simples olhares, mas essa necessidade de contacto é das que mais se manifesta. e arrisco-me a dizer que se manifesta em todos os seres humanos.
para pertencer é necessário abdicar-se da identidade. é um estorvo à comunicação muito grande. opiniões fortes, posições vincadas, pouca tolerância. é isso que faz a identidade e é isso que desfaz as relações interpessoais. noutro filme de Kaufman, Being John Malkovich, vemos como uma personagem assume a identidade de Malko de forma a poder enamorar-se com a mulher por quem estava obcecado. nem todas as as relações humanas precisam de abdicação. mas quando as pessoas são mais duras, mais autênticas, torna-se complicado estabelecer-se um diálogo.
a massa, esse ser enorme do qual nós somos pequenas células, precisa que nós deixemos de ser nós. a existência não faz qualquer tipo de sentido, pelo menos a nossa. pode fazer, se formos nós próprios. mas aí, estamos a destruir-nos, a lançar-nos ao vácuo da velha e miserável solidão.
parece que agora a educação, tal como a cultura sempre tem servido, serve para equilibrar as contas da nação. enquanto isso a edp faz mil milhões de lucros que irá distribuir pelos accionistas. já nem falo do escandaloso monopólio e controlo do mercado por parte da edp, mas pelo menos podiam começar a pagar os dezasseis mil milhões que devem ao estrangeiro.
política para iniciantes: o que interessa são cortes. não interessa onde. aliás, quanto mais importante for o sector melhor. e depois ainda despachamos a culpa para quem no-los pediu.
McMurphy: What do you think you are, for Chrissake, crazy or somethin'? Well you're not! You're not! You're no crazier than the average asshole out walkin' around on the streets and that's it.
mais do que um filme sobre loucura, um filme sobre sanidade e liberdade.
Chief Bromden: My pop was real big. He did like he pleased. That's why everybody worked on him. The last time I seen my father, he was blind and diseased from drinking. And every time he put the bottle to his mouth, he don't suck out of it, it sucks out of him until he shrunk so wrinkled and yellow even the dogs didn't know him.
num concerto simpático, calmo, com os devidos picos de energia, os long way to alaska apresentaram as suas belas músicas. com muitas falhas técnicas, que nada tiveram que ver com os bracarenses, evidenciou-se no entanto uma falha da organização da mostra: os long way to alaska por muito bons que sejam têm ainda pouco trabalho, pelo que o concerto acabou por saber a pouco, não durando muito mais que uma hora. teria sido melhor, à semelhança do que se passou o ano passado e no anterior, fazerem um concerto duplo.
só num país desmotivado, deprimido, miserável poderiam aparecer as letras de nuno prata. letras de um povo que se conforma, de um povo que desiste, voz de quem se calou e comeu. nas palavras do jornalista de Blitz, creio que Rui Miguel Abreu, mais do que a crítica, a música do ex-ornatos, etiqueta difícil de descolar, é música de "constatação social".
instrumentalmente originais é impressionante ver nuno prata, nico tricot e antónio serginho ao vivo. descontraídos, conseguem dar valor aos difíceis intervalos entre as músicas, transformando duas horas numa experiência única, fazendo a nossa atenção balouçar entre a voz e os instrumentos.
dentro de algumas horas sobe ao palco do auditório da casa das artes de arcos de valdevez nuno prata, músico celebre por ter sido baixista dos míticos Ornatos Violeta, que assumiu a solo uma marca muito pessoal. com dois trabalhos a solo: Todos os Dias Fossem Estes (Outros) e Deve Haver de 2010 o cantautor (não sei se a designação é correcta) traz a promessa de um grande espectáculo com músicas brilhantes como Hoje Quem?, Se Acabou, Acabou ou Essa Dor Não Existe. com um registo fortemente acústico as letras assumem uma posição central nos ritmos brilhantemente construídos. não será ainda de espantar alguns ecos da sonoridade dos OV na música daquele que é um dos mais autênticos e melhores artistas a trabalhar a solo da actualidade na ocidental praia lusitana.
é verdade, sai amanhã aquele que é, para já, o mais forte candidato a álbum do ano. pela amostra desta excelente Lotus Flower, só podemos esperar coisa boa...
com interpretações brilhantes de Kevin Spacey, Chris Cooper e Wes Bentley a direcção mágica de Sam Mendes transforma o belíssimo guião de Alan Ball numa experiência única. um filme sobre falsa moralidade, sobre desejo, sobre o peso do quotidiano e a destruição da identidade, sobre liberdade, mas sobretudo sobre a beleza de tudo, desde a vida em geral a um saco de papel que em dias de tempestade se mantém aéreo por muito tempo. um belíssimo filme.
dotados de um hip-hop consciente de lirismo admirável, os Dealema estiveram o fim-de-semana passado no sons de vez. o colectivo nortenho veio apresentar o ep do ano passado Arte de Viver. esquecendo um pouco esse trabalho, penso que é importante fazer ênfase aos dois trabalhos anteriores, assim como às influências do seu trabalho que por vezes brotam.
com hip-hop poético, não se limitando a rimar, os dealema apresentaram em 2008 o notável V Império, com o intuito de expandir, não só a sua influência, como também a lingua portuguesa (não tivesse este conceito sido criado pelo padre antónio vieira). nele há ecos de 1984 de orwell, com uma reflexão sobre a violência como ferramenta de submissão de um povo em sala 101,ecos de kafka na metamorfose, neste caso do espírito. juntando a estas referências uma poesia que reflecte sobre a sociedade, sobre o indivíduo, sobre o amor, sobre o ódio, sobre a solidão, concentrando forças na consciência social e no papel da arte no processo de transcendência, torna-se um trabalho de audição fundamental, para quem gosta deste estilo de características tão próprias.
com características semelhantes apresentaram em 2004 o homónimo Dealema, mais poético e mais forte psicológica e artisticamente, na minha opinião.
mais do que boas rimas e instrumentais os dealema apresentam sempre bons conceitos e grandiosas referências culturais, algumas evidentes por serem tema central de álbuns ou de faixas, outras mais discretas (lembro-me por exemplo de uma referência aos cães de Pavlov).
de atlanta, eua, os the n.e.c. apresentaram em 2010 este álbum Is. apresentam-se no myspace como psicadélico shoegaze, o que os classifica melhor que qualquer outra etiqueta (ainda que eu não saiba descrever o shoegaze), e têm neste álbum um excelente exercício de expressão musical. com diversos pontos fortes, destaco a Tightroper (no player carregando no botão de informação vai-se ter ao bandcamp onde se pode escolher a faixa), talvez por ser de todas a mais simples, sem que isso ponha em causa a sua harmonia e a sua beleza. com a voz distorcida, as guitarras servem o prato principal, enquanto o baixo e a bateria elevam a música a uma qualidade surpreendente. é de louvar o poder com que iniciam o álbum.
mais um filme nascido da pena de Charlie Kaufman. mais um filme genial. a realização de Michel Gondry assenta-lhe que nem uma luva (especialmente aqueles aparentes defeitos) num filme que retrata de uma forma espantosa a natureza humana. como em qualquer filme de Kaufman por trás de uma ideia invulgar (ainda que neste caso não tão original como noutros filmes) surgem diálogos, relacionamentos e contactos humanos que transformam uma comédia bem disposta num filme perturbante em que os lados mais fracos do homem, o desejo à adaptação, a indecisão, a traição são postos em exposição. tudo isto a partir de uma mulher com muito pêlo, um cientista comportamental e um selvagem educado pelo pai para ser um macaco. um filme obrigatório para quem gosta de psicologia. Nathan Bronfman: Remember, when in doubt, don't ever do what you really want to do. Lila Jute: That's the key.
Nathan Bronfman: What is love anyway? From my new vantage point, I realize that love is nothing more than a messy conglomeration of need, desperation, fear of death and insecurity about penis size.
as ideias quando quadradas e com ângulos, mesmo que encaixem, não deslizam. é um poema que as faz deslizar. é o pensamento sem sentido, sem lógica, que desliza rio abaixo. o pensamento lógico é mais duro, mais resistente, obstruindo a artéria, secando a alma. e somos só números, não interessa a alma, porque a alma pesa no corpo, é o apêndice da existência, o que interessa é a inteligência e a capacidade de dizer frases completas sem dar erros e fazer contas abstractas e ver os mercados cair. a beleza, a arte, a música das coisas não interessa para nada. não se constroem casas com blocos de fluídos.
Alphaville de Jean-Luc Godard retrata uma sociedade tecnocrata, uma sociedade lógica, à qual chega um agente secreto dos "países exteriores" cuja missão principal é destruir esta sociedade robótica. esquecendo toda a qualidade do filme, a imagem e música perturbantes, a beleza e o charme de Anna Karina, vale a pena pensar na nossa sociedade.
olhemos para os nossos governantes. olhemos para a actualidade. olhemos para toda a burocracia e todo o afastamento humano que permitiu que uma mulher estivesse morta em casa durante 9 anos, caso que, infelizmente, não é único. existe uma crescente automatização da sociedade. tudo é automático. tudo são números e probabilidades. engenheiros, economistas e advogados preenchem grande parte dos lugares da assembleia. poucos são os sociólogos e os que estudam os homens, as pessoas. porque controlar números é fácil. as pessoas são bem mais abstractas.
nessa perspectiva, este Alphaville devia ser obrigatório para todos os governantes.
variando entre o registo transcendente e o brit-pop que lhes é conhecido, os Supergrass têm neste Tales of Endurance um som de resistência, abrindo o excelente Road to Rouen de 2005, que inclui, por exemplo a brilhante St. Petersburg. é realmente uma pena que a banda britênica tenha acabado.
(creio que não existem mais para além desta. se alguém souber porque é que se chama part.4,5 6, pode acrescentar nos comentários)
vindo dos If Lucy Fell, dos I Had Plans e dos recentemente formados Asneira, Rui Carvalho decidiu avançar por uma carreira a solo. com o bonito nome de Filho da Mãe deambula por sonoridades tão diferentes como a guitarra de Carlos Paredes (deambulação menos frequente) e os Blues bem americanos, formando um estilo único, diferente de tudo o resto. com apenas (apenas? tanto!) uma guitarra semi-acústica de cordas de nylon cria magníficos ambientes em que não só a música maravilha, como também a dança dos dedos do Filho da Mãe, visualmente incrível de ver, embriaga o público.
o som deste vídeo não terá grande qualidade, haveria outros com melhor, mas esta é a música que gostaria de destacar, principalmente pela presença das sonoridades coimbrãs do fado e americanas do blues. aconselho a passagem pelo seu myspace.
não tocaram esta, mas resume a minha atitude no concerto que, a propósito, foi absolutamente perfeito, desde que o Filho da Mãe entrou em palco. por falar nisso, vale a pena conhecer o Filho da Mãe:
neste momento sinto ódio por todos os seres humanos. a isso chama-se raiva. neste momento apetece-me fazer algo, mas não me consigo mexer, nem pensar no que será. a isso chama-se tédio.
os irmãos Cohen têm, nos últimos anos, feito, de forma regular, alguns dos melhores filmes da actualidade. com um duro No Country For Old Men em 2007, um confuso e esquizofrenicamente divertido Burn After Reading em 2008, um existencial A Serious Man em 2009 e o último True Grit, que ainda não vi, em 2010, conseguem aquilo que Woody Allen, por exemplo, não consegue: lançar um filme por ano com uma qualidade elevadíssima e a um nível tal de perfeição, que só mesmo duas pessoas o conseguiriam fazer, em prazos tão apertados (note-se que Woody Allen desde de 77 que lança um filme por ano, enquanto que os Cohen só entraram neste ritmo muito mais recentemente).
em A Serious Man os Cohen contam a história de um professor universitário que vê o seu casamento, o seu emprego, a sua condição moral, assim como a financeira, e a liberdade do seu irmão em risco, ao mesmo tempo. é neste momento que Larry Gopnik (magistralmente interpretado por Michael Stuhlbarg) entra em desespero com o ritmo alucinante com que todos os problemas surgem e crescem, procurando respostas na religião judia, a qual sempre fez por respeitar. um filme sobre fé e esperança, que acaba de uma forma absolutamente inesperada. atingindo várias vezes um registo cómico com a indiferença e incompreensão que as pessoas têm para com Larry é um filme negro, muito negro.
as interpretações são brilhantes, a música deambulando sobretudo entre o mais conhecido tema dos Jefferson Airplane e uma composição de Carter Burwell é perfeita e a imagem maravilhosa. a realização é perfeita assim como o filme é irrepreensível.
"The Uncertainty Principle. It proves we can't ever really know... what's going on. So it shouldn't bother you. Not being able to figure anything out. Although you will be responsible for this on the mid-term."
o que se está a passar no egipto é importantíssimo, não só para áfrica, como também para nós, ocidentais. é o futuro de toda uma civilização global que está em jogo. não tenho muito bem a certeza, sou muito novo, mas parece-me que este é o primeiro movimento de revoltas genuinamente popular a acontecer numa aldeia global e num país não ocidental.
de uma forma lacónica, este processo que começou na tunísia, julgo, pode ter dois resultados: a chegada da verdadeira democracia a áfrica, que com todos os seus defeitos é mil vezes melhor que as ditaduras impostas; ou a imposição de regimes ainda mais autoritários. independentemente do que isso significa para o egipto, para nós ocidentais isto pode valer como incentivo ao protesto ou, por outro lado, levar ao medo, porque afinal de contas as revoluções ainda que feitas por populares, não vão de encontro à vontade geral, tendo muitas vezes consequências nefastas como sangue, feridas, fracturas, infecções, miséria, violência.
o egipto, que há muito havia perdido o poder (o popular), decidiu revoltar-se e mostrar que um cidadão pode não mandar nada, mas que só no cairo há 20 milhões e que esses sim são o egipto, esquecendo os exércitos, governantes, fronteiras. os países são as pessoas, os povos, as culturas. e uma revolução por semana dava jeito para não nos esquecermos disso.
vidrados com baixa auto-estima somos todos uns miseráveis que andam sem saber por onde vão. daí o sucesso, a sua necessidade. num mundo sem miseráveis o sucesso era mescla comum de vida e integridade biológica, o sucesso era indiferente porque existir era mais importante.
somos todos miseráveis, vivemos com baixa auto-estima, o rico, o saudável, até o feliz. todos pobres coitados às mesmas leis superiores, divinas ou sabe lá alguém o que são. até os deuses são miseráveis. sujeitos a se amarem, a se odiarem, a mandar profetas à terra, a criarem de um chicho de carne entalado numa costela um ser lindo e magnífico. é a loucura, a psicose, a falta de bom senso largar seres com percepção ao seu destino.
miseráveis, miseráveis, oh miseráveis seres. isto é um grito de desespero, um grito de despego, um grito de liberdade que algo ou alguém quis que eu desse, ou talvez não quisesse mas assim fez.
com uma belíssima capa, Helpless Blues é, definitivamente, o nome do segundo e novo álbum dos Fleet Foxes. com uma primeira parte mais tradicional, o tema de avanço (de mesmo nome que o álbum) apresenta a sonoridade própria dos Fleet Foxes, desta feita banhada com guitarras eléctricas, no que pode ser uma aproximação aos Blues, como, aliás, parece ser prova disso o título do álbum.
desde o primeiro momento da sua carreira, os linda martini mereceram respeito e aclamação do público. mereceram um apoio quase incondicional daquela que é uma das maiores bases de fãs (não organizada) da música alternativa e moderna portuguesa da actualidade. com as suas guitarras transportam quem os ouve para um mundo próprio onde se percebe a magia que o baixo e a bateria vão fazendo e todo o poder que emana das suas letras, quando há voz. porque os linda martini não precisam de voz para nos mostrarem alguma da melhor poesia que já se fez em portugal. instrumentalmente perfeitos, liricamente densos, os linda martini são um dos destaques do cartaz deste ano do sons do vez.
não existe nada mais breve que os momentos que ficam para sempre. um sorriso, um cumprimento, um toque, um nome, um olá. tudo isso não se esquece nunca. uma expressão facial, uma música, um sentimento, um filme, um concerto, um livro. são coisas que tão depressa começam, como depois teimam em não desaparecer nunca. em oposição temos as demoradas filas de trânsito, as longas horas de trabalho, os complexos processos burocráticos, que, uma vez terminados, desaparecem num instante, apagados da memória de longa duração que dirige o homem ao céu ou ao fundo da terra, conforme pecou muito ou não, ou conforme tem mais que fazer do que acreditar em seres superiores. a memória é selectiva. por vezes tortuosamente selectiva. creio que nunca deixarei de dizer aquele nome, mesmo na ausência da sua legítima proprietária.
não sou o maior fã de Queen. eles são me relativamente indiferentes. mas têm músicas fora do normal. é o caso da Bohemian Raphsody e desta Play the Game, por exemplo. sem luxos, constroem uma relativamente simples canção de amor. belíssima por sinal.
paranóico, com personalidade única, vai-se afastando do mundo. é assim Alvie Singer, o protagonista de Annie Hall representado pelo próprio Woody Allen, que aparte toda esta animosidade para com o mundo e a incapacidade de se relacionar profundamente com mulheres está profundamente apaixonado por Annie Hall.
Annie Hall é um interessante exercício de abstracção da realidade em que, tal como noutros filmes de Allen, a câmara não tem medo de se fazer notar, servindo de registo da mente de Alvie e, consequentemente, de Woody Allen.
este filme de 1977 é também um ensaio sobre a inevitabilidade da morte que aprofundou já em 2009 comWhatever Works (no fundo Boris, tal como Alvie, é um pseudónimo de Woody Allen, abordando por isso temas muito semelhantes).
"´There's an old joke - um... two elderly women are at a Catskill mountain resort, and one of 'em says, "Boy, the food at this place is really terrible." The other one says, "Yeah, I know; and such small portions." Well, that's essentially how I feel about life - full of loneliness, and misery, and suffering, and unhappiness, and it's all over much too quickly. The... the other important joke, for me, is one that's usually attributed to Groucho Marx; but, I think it appears originally in Freud's "Wit and Its Relation to the Unconscious," and it goes like this - I'm paraphrasing - um, "I would never want to belong to any club that would have someone like me for a member." That's the key joke of my adult life, in terms of my relationships with women."
O Deus das Moscas de William Golding é uma interessante reflexão sobre a origem do mal, sobre o caos e sobre o medo. a partir de um núcleo de crianças que sobrevivem a um acidente de aviação numa ilha deserta gera-se uma sociedade que tem dificuldade em se organizar. o medo, encarnado numa fera imaginada, destrói por completo a união dos pequenos, assim como a capacidade de pensar, libertando todo o mal, todo o ódio que até ali se havia acumulado. é um livro duro, que está magnificamente escrito para nos dar um soco na alma.
"-Imagina tu! Pensar que a Fera era alguma coisa que se poderia caçar e matar! - (...) - Tu sabias, não é verdade? Eu sou parte de ti próprio. Aproxima-te, aproxima-te ainda mais! Sou eu o motivo por que não se pode ir mais além? Porque é que as coisas são o que são?"
A Rede Social não é um filme de reflexão, é antes um filme de entretenimento que sai da memória com facilidade. mas é um filme de entretenimento notavelmente bem construído que não deixa o espectador perder a atenção, engolindo-o na música magistralmente composta por Trent Reznor e na realização intensamente cerebral de David Fincher que transforma uma simples história de negócios, traições e intrigas numa elaborada experiência das mais fortes emoções humanas. com boas interpretações (destacando-se a excelente do protagonista Jesse Eisenberg), o filme termina com Baby I'm A Rich Man dos Beatles, uma escolha perfeita. menos essencial que outros filmes de David Fincher, este é um filme que vale a pena ver.
PS:. as parecenças deste filme com o filme 21 são óbvias. descobri agora mesmo que ambos são adaptados de livros de Ben Mezrich,tendo produção da empresa de Kevin Spacey.
"Descobre que compreende o tédio da sua existência, em que cada caminho é uma improvisação, e uma considerável parte do tempo em que está acordado é consumida em ver onde põe os pés."
William Golding em O Deus das Moscas
é isso. sacanagem de olhos que nos fogem do lugar, para se concentrarem em algo tão fútil como o solo, como se fizesse mal algum tropeçarmos, cairmos, falecermos, virarmos húmus.
a inevitabilidade da morte é, por si só, um tema inesgotável. em 1957, no mesmo ano de Morangos Silvestres, Ingmar Bergman pegou no texto bíblico e nos sete selos (sendo o sétimo a morte) e numa época manchada pela peste negra, para criar um texto notável. também a inexistência de deus aparece nesta obra em que a luta contra a morte está brilhantemente metaforizada num jogo de xadrez, em que o resultado, desde o início parece estar definido.
voltando aos Broken Water, recebi feedback deles. um dos seus membros, jon, mostrou algum embaraço na inclusão do vídeo de uma performance da Memory, que, na opinião dele, não é das mais bem conseguidas. deixou também ligações de outros concertos. desde já agradeço ao jon, e aos broken water, por terem perdido tempo a ler o comentário ao álbum que eu fiz. e aqui ficam as escolhas de jon:
há muito que ando para ouvir alguma coisa do Nick Cave, escritor e guionista que ficou conhecido pela sua música com os Bad Seeds (Nick Cave & The Bad Seeds). os Grinderman editaram o segundo disco o ano passado, Grinderman 2, mas só agora ouvi esta Man In the Moon, um registo de 2007 que vale a pena ouvir: teclados que chamam por The Doors,um notável papel de guitarra (ou de similar instrumento de cordas eléctrico), um baixo aditivo com a bateria a finalizar. chega-se a sentir o sonho e desilusão da letra magistralmente composta por Nick Cave.
Eu não sou eu nem sou o outro, Sou qualquer coisa de intermédio: Pilar da ponte de tédio Que vai de mim para o outro.
Mário de Sá Carneiro
sinto tédio. mais que isso, sou tédio. tão deprimente como qualquer palhaço pode ser. é interessante ainda assim essa indefinição: não ser nada, ser a ausência de tudo. não é interessante, é antes giro de se dizer, porque é giro dizer coisas contraditórias, ou talvez não seja giro, mas dá-me um gozo do caraças e é assim que não me encontro.
não fazer nada é, até certo ponto, uma manifestação última de liberdade: fingindo de morto, atingimos essa liberdade suprema que é estar independente do corpo, do mundo, até do espírito, como um pedaço de nada que somos, sem consciência atrás de nós, perdidos no vazio. ou isso ou como estar preso num poço sem ter como sair, apenas sabendo o quanto se deseja estar no exterior.
a forma intempestiva como o piano entra em The Pelican, em harmonia com a voz desesperada, em nada previne o ouvinte para a força libertada aquando de "leave you nothing", desaguando numa sequência de bateria e guitarra perfeita. é uma alegoria de um pelicano e do pescador a quem rouba o peixe, uma relação humana em que existe aproveitamento de uma das partes, susceptível a forças superiores. retirada de Friend and Foe, o brilhante álbum dos Menomena!.
eternidade é para sempre. antes de acabar recomeça e é como se tudo fosse tudo desde sempre. e o nada nunca foi mais que uma ilusão, pedaço de algo sem nome. e não me chamas, dás-me a mão com a face triste e nem sempre foi assim, mas eterno prossigo eu, como se não tivessem passado os anos que passaram, como se não fosse já tudo diferente. eu prendo-me às eternidades e fico melancólico. infames eternidades que já são noutro sítio, não aqui. aqui é tudo como parece ser: tédio, carbono e água.
Brave New World, de Aldous Huxley, apresenta-nos uma sociedade "perfeita" onde "toda" a gente é feliz, incentivada a ser feliz, obrigada a ser feliz, através de diversos mecanismos de condicionamento, aquilo a que hoje se poderia chamar programação. à parte a história, bem conhecida de muitos, fica lançada a questão "o que é mais importante? a felicidade ou a liberdade?", para além da mais negra e sombria "não é também o desejo da liberdade fruto de programação? e se assim for, será a liberdade livre?". uma das possíveis respostas é a existencialista, a de Sartre e amigos, segundo a qual, a liberdade só pode existir quando o ser está condicionado: são os condicionamentos que dão ao indivíduo a liberdade.
voltando ao livro, é um romance muito pessoal, muito importante para a reflexão e para o auto-conhecimento. um livro fundamental para a construção completa do indivíduo.
ps:. sintam-se livres para dar a vossa opinião ou, até, colocar novas pergguntas.
a maior parte dos filmes são de 2009, mas estreados em Portugal em 2010. por ordem mais ou menos aleatória. não vi muitos filmes que gostava de ter visto. vi a Origem.
é insensato tocar com o céu nas mãos, foto da casa
é insensato dizer que estou deprimido ou que tenho qualquer tipo de perturbação mental. é só o tempo que passa e eu não sei que lhe fazer. é só a existência que é vaga, esquizofrénicos de nós que vemos não um reflexo mas vários rostos humanos. é só a solidão da multidão, a solidão do pequeno grupo, a solidão da privacidade, a solidão de se ser humano distinto dos restantes e mais ninguém ver, como nós. é só a virtude que não é de todos, porque não chega um desafio, que multiplica-se logo por todos os seres, vezes vários. é só a carne que apodrece, ou que para não, não deixa apodrecer outras carnes. é só o reflexo de tudo, porque não se bastava ser, ainda há consequências, reflexos, peixes-espada e barbatanas. é só a depressão que se espalha por todos os humanos igualmente miseráveis que têm de viver com o que lhes dão. é só tudo, é só nada, é só uma música,um poema.
como tem acontecido todos os anos, o Sons de Vez vai-se organizar entre fevereiro e março, com bandas de grande qualidade. é uma pena que não tenha escrito nada sobre alguns desses nomes. merece destaque a qualidade gráfica do cartaz.
inicialmente, o título deste filme chamou-me a atenção. depois, o nome de Jared Leto roubou-me a vontade. por fim, o trailer obrigou-me a ver o filme. e ainda bem que vi o trailer!
constitui as memórias de um velho (o último mortal) que se confundem. um filme sobre escolhas e sobre um homem que viveu todas as vidas que poderia ter vivido, porque qualquer uma delas era a vida certa... tudo com base na escolha impossível de um dos pais para uma criança. poético, confuso, apresenta ainda algumas teorias científicas interessantes, abordadas de uma forma poética. foi uma agradável surpresa.
Nemo Nobody velho: Before he was unable to make a choice because he didn't know what would happen. Now that he knows what will happen, he is unable to make a choice.
orgias de guitarras, bateria magistral, baixo poderoso, palavras que nos roubam a alma. é difícil escolher um álbum dos Linda Martini, todos diferentes, todos igualmente perfeitos. este foi para mim o álbum de 2010.
para além de um universo doloroso, intenso e poético comum a todas as músicas, há algumas que se destacam, por apresentarem uma maior intensidade e densidade psicológica. em Nós os Outros sente-se o desespero de uma relação que nunca funcionou, na Mulher-a-Dias vê-se a sujidade e o caos da alma desarrumada, a toda-poderosa bateria de Hélio Morais atinge o céu para nos dar uma reflexão sobre a partida em Elevador, há espaço para o devaneio juvenil de Juventude Sónica, o baixo perfeito e a crítica ao mau perder como incentivo à acção em Belarmino VS. tudo isto num álbum que reflecte o início dos Linda Martini, o regresso a um universo que é deles, um álbum que após as primeiras audições exorciza qualquer coisa.
nunca percebi se nesta cena ele estava a ser sarcástico ou se é mesmo uma estratégia para lavar as mãos. de qualquer das formas, aposto na primeira hipótese.
talvez seja exagerada esta posição dos Broken Water. partindo de influências claras de Joy Division e Pixies, os Broken Water caminham por registos muito longe das minhas preferências, caminhos paralelos a bandas como Best Coast e Dum Dum Girls, mas numa intensidade e complexidade muito superior. o que os fez merecer tão elevado posto no top foi a forma como conseguiram reproduzir esse som e construir um álbum perfeito dentro do estilo, para além de intenso e profundamente melódico.
um baixo digno de Peter Hook, uma bateria com alma, solos pequenos e escassos mas perfeitamente enquadrados e rasgueados aliciantes, para não falar nas duas vozes desanimadas, no melhor dos anos 90. adicione-se a isso alguns rasgos profundos de identidade própria e apresentam-se assim os Broken Water.
das 8 canções deste álbum de apenas 30 minutos há 3 músicas que se destacam naturalmente: a belíssima Kamilche House e as poderosas Say What's On Your Mind e Memory, esta última tendo o momento alto do álbum: um solo de guitarra fenomenal, pouco floreado, simples e eficaz.
a partir de A Feira de Atrocidades de J.G. Ballard os Mão Morta construíram este álbum conceptual. "como se a vida se transmutasse num perturbante pesadelo de desconcerto numa mente entorpecida pelo peluche do conforto" diz Adolfo Luxúria Canibal. então, ao longo do álbum vão-nos sendo apresentadas bizarrias diversas bem acondicionadas pelo instrumental. "mais vale nascer e morrer, do que não nascer e não morrer" ouve-se em Fingir de Morto: é assim que se retira valor à morte, encarando-a com realidade. no fundo é isto que os Mão Morta vão fazendo.
numa abordagem mais sombria, O Seio de Esquerdo de R.P. apresenta-nos a bizarria das imagens de alguns grafitos e o processo cerebral que lhe é referente, Tiago Capitão conta-nos a história de um criminoso que se escondeu na sociedade tentando apagar a identidade, Biblioteca Espectral volta ao nosso cérebro para nos explica-nos a memória e Metalcarne, num registo que passa pelo electrónico para ilustrar fetiches.
de um ponto de vista mais bem disposto e, aparentemente irónico, a fim de provocar o contraste entre as duas dimensões do registo, são-nos apresentados a já referida Fingir de Morto, Teoria da Conspiração, que dá apoio às teorias da conspiração , o funk-rock de Estância Balnear e o single Novelos de Paixão. esta última, com uma letra básica, muito abaixo do habitual de Canibal, é a ganha-pão do álbum.
um pouco à parte aparece Tardes de Inverno que, nem sombria nem alegremente, nos dá com toda a força. um instrumental imediato, poderoso e duradouro (agora e para sempre), uma letra muito bem articulada apresentado com a melhor voz do Adolfo a tocar o desespero " demência sem jeito/num rumo desfeito".
não é com certeza o melhor álbum dos bracarenses, mas é um álbum em que por várias vezes atingem o nível da genialidade, como é o caso das duas músicas seguintes.
um paciente conto que mexe com moralidade, autoritarismo, repressão e a reacção. com brilhantes reflexões sobre a morte e a existência (o clip abaixo é, talvez o mais conhecido do filme) e com uma narrativa fluente e penetrante, O Laço Branco torna-se um filme obrigatório, obviamente para quem respeite o género. (é difícil falar sobre o filme).
os MGMT fartaram-se do indie pop e evoluíram para o indie rock psicadélico e, diga-se de passagem, ainda bem. já almejado o sucesso, decidiram usufruir da liberdade num álbum que, pelo menos no meu caso, demorou a cativar. enquanto no anterior trabalho (pelo menos nas músicas que passam na rádio, nunca me dei ao trabalho de ouvir o álbum anterior, tentei, mas não era para mim) destacavam-se melodias simpáticas que nos entravam pela cabeça dentro e não saiam enquanto não nos dissessem o quão bonitos éramos, neste a construção musical é bem mais complexa com variações de energia e de estados de espírito muito interessantes e com recurso a uma sonoridade e a elementos claramente psicadélicos. parece impregnado com uma boa dose de ironia. o próprio título é ironia pura, porque mais que se congratularem com o álbum anterior decidiram fazer algo diferente.
arrancando com a enérgica e festiva It's Working, atinge a melancolia em Someone's Missing, a loucura eufórica de Flash Delirium marcada por alguns rasgos de genialidade, o existencialismo de Siberian Breaks (é a palavra que utilizo para descrever "there's no reasons/ there's no secrets to decode") espalhado por 12 minutos absolutamente irresistíveis, o horror instrumentalmente riquíssimo Lady Dada's Nightmare, finalizando esta reflexão sobre o primeiro registo com a faixa-titúlo, também ela impressionante.
no futuro espero mais destes MGMT. este álbum mais do que uma confirmação, é a promessa de uma banda superior, ponto de transição entre o pop das massas e a música de culto.
obsessão é efeito boomerang. é algo que temos dentro de nós que vai e vem, não nos deixando. algo que marca a nossa existência, marca os nossos actos, por ser o caminho que nos aparece pela frente para seguirmos ou não. é uma insensatez segui-lo. é o caminho do sofrimento e da perturbação mental. assim como a insensatez do jobim é obsessiva, eu sou obsessivo: por ela por música, por vida. a vida é obsessiva. só as coisas neutras não provocam obsessões.
como uma música tocada em repeat, a obsessão é o desejo de criar um circulo, uma linha que nos salve do efémero, que nos granjeie eternidade. a obsessão é o medo da morte e o medo da vida. é uma fuga de sofrimento e dor, que nos parece guiar a algum lado, limitando-nos a passear num carrossel . no fundo todo o esforço é inútil, a sobrevivência é inútil, a vida é inútil. não só as artes. tudo é inútil, a partir do momento em que temos uma escolha que nega tudo, fazendo com que nada exista. nada que seja susceptível de não existir é útil, tudo é inútil. é a obsessão que nos faz seguir por entre o inútil. também ela é inútil. tudo é inútil. cada um cria para si os seus universos de inutilidade. a liberdade é isso.
e a obsessão não a limita. é lhe indiferente. a obsessão sou eu. a obsessão é isto em repeat:
de todos os projectos influenciados pelo rock progressivo dos Pink Floyd, este é um dos meus favoritos. Crippled Black Phoenix é um supergrupo britânico cujos membros vêm de bandas como Mogwai, Iron Monkey, Electric Wizard e Gonga. a banda, que se formou em 2004, lançou 4 álbuns, 3 dos quais entre 2009 e 2010. um deles este I, Vigilante.
poderoso, épico, este álbum move-se em torno de um conceito que ronda a justiça após a injustiça (talvez daí o vigilante do título), como a bonança após a tempestade, socorrendo-se de factos históricos (que eu desconheço) na construção dos papéis líricos. as letras, maioritariamente duras, pouco flexíveis e contidas, libertam-se em determinados pontos da música levando atrás de si toda a música, e a voz, obviamente. é esta harmonia que nos desarma. escusado será dizer que o trabalho das guitarras está absolutamente bem conseguido, assim como a bateria e o baixo. este último, em algumas linhas, assume contornos inesperados que fazem toda a diferença. há ainda piano, orgão e diversas cordas que funcionam na perfeição, conferindo uma voz épica ao álbum. é o caso de Bastogne Blues, que apresentando alguma influência oriental, é um épico que parte da ideia de um jovem nazi morto cuja imagem ia sempre atormentar, à noite, o narrador. muito forte e intempestiva aparece We Forgotten Who We Are, que constata a falta de interesse que existe em relação à história, com a bonança de Fantastic Justice, que remete para um futuro, ou presente, em que as injustiças findarão, ou pelo menos para essa esperança.
o álbum abre de uma forma desarmante com Troublemaker, que com um refrão aditivo, perfeito e de efeito duradouro, se torna a faixa mais poderosa do álbum. a explosão que ocorre no refrão, permite tudo isso, com baixo, guitarra e voz a puxarem todos para o mesmo lado.
apesar de não tão frequentemente como outras bandas, os CBP recorrem ainda a alguns clichés do rock progressivo, que só os prejudica, pois eles, sendo uma banda de rock progressivo , abarcam muitas mais influências das outras experiências dos músicos que a constituem. talvez por causa disto eu considere que a música Of a Lifetime está a mais no álbum. talvez seja necessária para o conceito do álbum, mas musicalmente para além de não se assemelhar, não está ao nível das faixas anteriores. pelo menos para os meus ouvidos. e só por isso este álbum não está uns lugares acima.
as diferenças entre este Plastic Beach e o anterior Demon Days são óbvias: num ambiente mais amplo, uma variedade de sonoridades maior, um conceito, talvez, menos interessante. enquanto alguns álbuns ganham força na homogenia, este vai buscá-la à grande variedade de músicas e estilos. é sobretudo um álbum menos sombrio. temos White Flag com os jambés e os sons de influência aparentemente árabe, Rhynestone Eyes em que a voz de Damon Albarn ganha o máximo protagonismo, Stylo, a faixa mais sombria do álbum com participações de Mos-Def e Bobby Womack, a super-alegre Superfast Jellyfish, Glitter Freeze com Mark E. Smith (The Falls) que parece mesmo uma qualquer faixa do último álbum dos Muse, só que melhor (com excepção das mais orquestrais), Some Kind of Nature, música relativamente bem disposta que merece a voz de Lou Reed, On Melancholy Hill, provavelmente a música mais bela do álbum, a faixa-título que arranca patrocinada pelos Clash, naquela que é uma das melhores músicas do álbum, principalmente, mas não só, graças à introdução, To Binge calma e preguiçosa com Little Dragon, um quase À Cappela de Bobby Womack (Cloud of Unknowing), e Pirate Jet que encerra com muita classe e nível o álbum, entre outras que passam mais despercebidas. não sei se consegui, mas pelo menos tentei demonstrar a grande variedade de sons deste álbum.
não sou o maior apreciador de música electrónica, mas estes Gorillaz, que têm muito de electrónico (o último álbum deles The Fall pareceu-me, nos poucos contactos que tive, ainda mais electrónico), não deixam de fazer parte das minhas bandas favoritas e são das bandas mais influentes do momento.